Análise das ações das Procuradorias na pandemia de Covid-19

Atualizado em: 13/05/2022

A pandemia de Covid-19 é, até agora, a mais abrangente crise enfrentada pelo Estado brasileiro desde que a Constituição Federal de 1988 rege o ordenamento brasileiro. A situação sanitária mundial demandou de forma intensa ações ágeis dos Estados e Municípios. 

“Diante de uma crise, normalmente, o Poder Executivo é o mais importante agente. O protagonismo é do Poder Executivo. O Legislativo dá suporte e o Judiciário observa e ratifica algumas respostas”, observou o Procurador do Município de Recife (PE), Gustavo Ferreira Santos, durante o 2º Congresso Brasileiro Virtual de Procuradores Municipais (CBVPM)

De acordo com o Procurador, o que é esperado diante de situações como as impostas para a contenção da disseminação do Coronavírus está bem determinado pela citação: “Quando emergências nacionais ocorrem, o Executivo age, o Congresso aquiesce e o Tribunais deferem”. 

Gustavo afirmou que esse era o comportamento mais esperado. Mas no Brasil também ocorreu uma crise federativa que precisou ser arbitrada pelo Judiciário. Isso tornou a realidade diferente do que era aguardado.  

Um movimento observado é em relação às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). “As deliberações do STF abriram caminho para uma atuação mais efetiva dos Municípios”, opinou o Procurador. As medidas descentralizaram as ações para preservação da saúde na pandemia.  

Para Gustavo, essa tendência à descentralização foi claramente acelerada pela pandemia de Covid-19. Com isso, as respostas à pandemia envolveram a Administração como um todo. “Não foi apenas a Secretaria de Saúde agindo. A resposta foi, em certo grau, complexa e precisava de desenhos jurídicos”, analisou. 

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Reflexos sociais da atuação das Procuradorias na pandemia de Covid-19

Uma reação inevitável à ação dos municípios na pandemia foi a sociedade demandando das Procuradorias por meio de ações judiciais. Isso resultou em dois tipos de atuação da Procuradoria, classificadas por Gustavo Ferreira Santo em: 

Atuação Consultiva 

  • Edição de atos normativos; 
  • Organização de contratações; 
  • Aplicação da legislação da pandemia (ex.: interpretações sobre a Lei Complementar nº. 173/2020). 

Atuação Judicial 

  • Defesa das medidas adotadas pelo Município; 
  • Propositura de medidas para permitir a atuação do Município. 

O Procurador recordou que havia muitas dúvidas, por exemplo, sobre afastamento de servidores que eram grupo de risco para a doença e necessitariam trabalhar em casa.  

Somente o Município de Recife editou mais de 110 Decretos e 20 Leis a respeito da pandemia no período de dois anos. Muitos desses Decretos versam sobre contratações emergenciais, medidas fiscais e de estímulo econômico, e medidas de proteção social.  

“Então, foi necessário um planejamento muito grande. Isso tudo demonstrou a importância da Procuradoria”, reforçou Gustavo. Além disso, o Procurador afirmou que o Município deu um passo importante na legitimação como ente autônomo. Ainda, as Procuradorias puderam mostrar a sua essencialidade, acelerando as providências para as respostas à pandemia e ajudando a evitar transtornos. 

“A Procuradoria, às vezes, atua em uma zona cinzenta em que precisa iluminar o caminho do gestor. Temos uma responsabilidade perante o gestor, especialmente em momentos de crise. Precisamos viabilizar a eficiência das respostas que a Administração Pública quer dar para a crise como um todo”, finalizou. 

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As funções das Procuradorias em tempos de crises como a pandemia de Covid-19

Falar do papel das Procuradorias na crise requer uma visão genérica acerca das crises e de como a Procuradoria pode atuar. “Inclusive, uma crise que poderá haver em breve será a financeira e de autonomia constitucional em função da Reforma Tributária, caso [o texto] permaneça como está na Câmara dos Deputados”, disse o Procurador do Município de Fortaleza (CE), Juraci Mourão Lopes Filho.  

Uma Procuradoria detém algumas funções. A primeira elencada pelo Procurador do Município de Fortaleza (CE), Juraci Mourão Lopes Filho, é a de conferir segurança jurídica aos gestores. “Essa é uma atuação destacada em tempos de crise”, reiterou.  

A segunda é patrocinar judicialmente os interesses do município. “Tomada a decisão, a Procuradoria deve assegurar meios judiciais para fazer valer a decisão do gestor público. Nesse contexto, qual é o papel da Procuradoria? Pode a Procuradoria se negar a patrocinar esses interesses em momentos de crise?”, questionou.   

A terceira função da Procuradoria abordada pelo palestrante no 2º Congresso Brasileiro Virtual de Procuradores Municipais (CBVPM) é a de exercer o controle de legalidade passivo e prévio, e ativo e posterior.    

“Dadas essas três características, em uma crise, o primeiro ponto a ser ressaltado e defendido por todos os Procuradores é a questão da responsabilização perante os Tribunais de Conta, por exemplo. Exercer a atividade fim nas manifestações de soluções eminentemente jurídicas, embasadas e bem construídas deve ser ponto intransigível para cada Procurador”, externou Juraci.    

Afirmou que um instrumento para se fazer isso é o fortalecimento dos precedentes administrativos. Dentro desse hall estão os pareceres da Advocacia Pública. “Nesse caso, haveria adicionalmente o dever da Procuradoria em registrar seus pareceres, facilitar o acesso à consulta e utilizá-los para emitir novos pareceres, de modo a fortalecer a própria Procuradoria e os Procuradores, e a Administração Pública como um todo”, propôs.  

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Maneiras de as Procuradorias agir frente à pandemia de Covid-19

O Procurador Juraci Filho também trouxe para o debate sobre a crise a questão da Lei de Improbidade e os conceitos acerca do que é agir com responsabilidade e o que é agir com indeterminação: 

Agir com responsabilidade 

Agir com responsabilidade é acreditar que aquela solução é a melhor. Uma incerteza, solucionada com responsabilidade, a Procuradoria deve subscrever. 

Agir com indeterminação 

Agir com indeterminação é, com todos na dúvida, decidir conforme os interesses políticos.  Decisões tomadas com indeterminação, a Procuradoria não deveria subscrever.  

Um exemplo apresentado por Juraci para esses dois conceitos é o da pandemia de Covid-19. “Por mais que a OMS [Organização Mundial da Saúde] tivesse incerteza, suas atitudes eram tomadas com base em situações incertas, mas com responsabilidade; diferente de decisões tomadas sem qualquer responsabilidade em procurar qual seria a melhor solução. Este é um critério de como a Procuradoria deve agir em seu segundo papel”.  

O Procurador recordou que momentos de crise causam incerteza, mas nunca devem causar indeterminação, no sentido de que qualquer medida caberia. Na sequência, questionou: como diferenciar um agir do outro? 

A resposta dada por Juraci é: são questões de princípio. “Feito esse critério, para se medir o que são políticas públicas e medidas do gestor, há dois tipos de interesses principais”.  

Esses interesses, ainda segundo o Procurador, são os interesses federativos, ou seja, aquele que referenda a divisão das competências federativas. “O papel das Procuradorias é patrocinar as competências, a autonomia dos municípios, não só de forma passiva, defendendo isso em processo, mas cobrar a atuação diante de uma omissão dos outros entes. Esse papel é novo”, finalizou.   

Os Procuradores Gustavo Ferreira Santos e Juraci Mourão Lopes Filho compartilharam suas experiências e entendimentos com os participantes do 2º CBVPM, que foram estendidas ao blog do SAJ. Para fazer o mesmo, entre em contato e assine a newsletter do SAJ.