Qual é a importância da Lei Orgânica municipal?
Até 2003, Procuradores que atuavam em defesa das cidades não podiam contar com o apoio de uma Lei Orgânica municipal. Esse tipo de texto cria carreira e prerrogativas próprias de forma autônoma à gestão pública da cidade. Consequentemente, isso traz benefícios à advocacia pública, aos servidores e à sociedade.
O contexto começou a mudar no momento em que foi aprovada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) número 153, há 15 anos. Com o documento, os Procuradores municipais igualaram-se aos estaduais e federais nesses quesitos.
Quando vinculada a uma Lei Orgânica municipal, uma Procuradoria reforça suas disposições preliminares, estrutura organizacional, atribuições, competências e órgãos colegiados, por exemplo. O documento também separa uma parte especial à investidura do cargo de Procurador das cidades. São exemplos as legislações constituídas em São Paulo (SP) e em Florianópolis (SC).
Apesar de já ter passado mais de uma década da modificação do Artigo 132 da Constituição Federal, somente um quarto das Procuradorias municipais encontra amparo em alguma Lei Orgânica municipal. Pelo menos foi o que evidenciou o 1º Diagnóstico da Advocacia Pública Municipal no Brasil.
O estudo foi desenvolvido pela Associação Nacional de Procuradores Municipais (ANPM) e publicado no início deste ano. A ANPM e outras instituições, como a OAB, recomendam que as funções dos Procuradores e demais servidores sejam asseguradas por meio de um documento como esse.
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4 razões por que a Lei Orgânica municipal é importante para uma Procuradoria
Abaixo, listamos algumas justificativas para que cada Procuradoria esteja ligada a uma Lei Orgânica municipal. Veja:
1. Possibilidade de abertura de concurso público para Procurador
A aprovação da PEC 153/03 mudou a redação do Artigo 132 da Constituição nos seguintes termos:
“Art. 132 – Os Procuradores dos Estados, Municípios e Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.
Parágrafo único – Aos Procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após 3 (três) anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.”
Nesse sentido, a emenda possibilita a abertura de concurso público para formação de carreira. Ela serve de apoio tanto para o cargo de Procurador quanto para os demais cargos de apoio. O texto pode ser usado nas Procuradorias dos mais de 5 mil municípios brasileiros. A partir da contratação via processo seletivo, a categoria pode propor orçamentos, organizar períodos de férias e licenças-prêmio, por exemplo. Portanto, tudo vai estar em conformidade com os termos do artigo 132 da Constituição Federal.
Sendo assim, os Procuradores do município passarão de carreira do Estado (carreira política, vinculada a uma gestão específica) para a carreira de Estado (carreira pública, do funcionalismo público, que independe de uma gestão específica). O mesmo estudo da ANPM citado acima enfatiza que somente 34,4% das Procuradorias têm Procurador concursado, restando à maioria o comissionamento desse tipo de função, que é essencial à administração pública.
2. Mais autonomia e independência à atividade
À medida que deixam de ser servidores vinculados à prefeitura, os Procuradores podem ter mais autonomia em suas funções. Portanto, não têm mais um prefeito como chefe quando estão respaldados por uma Lei Orgânica municipal. Eles passam a ser amparados pelo regime jurídico-administrativo de instituição autônoma.
Por consequência, esse formato garante independência funcional, com o Procurador-Geral do município assumindo a figura de responsável supremo. Neste caso, a independência funcional dos Procuradores contempla até mesmo a fiscalização e a proposição de medidas contra agentes políticos ativos da prefeitura.
Portanto, esses profissionais tornam-se imunes às trocas de gestão. Consequentemente, fortalecem a estrutura da Procuradoria a partir da continuidade de seus trabalhos paralelamente à manutenção de uma memória jurídica.
Tem-se, portanto, a efetivação do propósito da advocacia pública municipal. Principalmente, no que se refere ao combate à corrupção e ao fortalecimento do interesse público. Em vez de meramente pertencentes à uma repartição municipal, esses profissionais passam a compor uma instituição capaz de exercitar o controle da legalidade. Eles também representam judicialmente o município de forma exclusiva.
3. Especialização da mão-de-obra jurídica do município
Os Procuradores municipais que têm as atividades garantidas por uma Lei Orgânica municipal podem prestar consultoria especializada à administração pública. Esse tipo de auxílio, denominado Consultivo, pode interferir, por exemplo, na área de licitações. Desta forma, a prefeitura deixa de ser a responsável pela análise de suas próprias licitações e delega à Procuradoria essa função.
Esse aspecto torna o trâmite mais isento. Há ainda a eliminação da contratação de bancas formadas por profissionais admitidos em caráter temporário. Essas bancas não conhecem a rotina e o perfil da Procuradoria. E o mais preocupante: não raro, são associados a esquemas de ganhos ilícitos. O levantamento da ANPM indicou que essa postura acontece em 53% das cidades, principalmente nas menores, e enfraquece a democracia.
4. Fortalecimento da estrutura
Atualmente, muitas das Procuradorias que não possuem Lei Orgânica municipal dependem de ação direta do prefeito em relação à estrutura física. O resultado são inúmeras Procuradorias sem a mínima infraestrutura de trabalho, desde bibliografia jurídica até telefone ou internet nos computadores. No texto que ampara a PGM de São Paulo, por exemplo, há um espaço destinado à garantia de tecnologia da informação, tão essencial atualmente para ganhos em produtividade.
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Quando há a redação desse tipo de lei e a vinculação às Procuradorias, a responsabilidade recai sobre o Procurador-Geral. Ele passa a ter de manter esses espaços com as condições mínimas necessárias para que as tarefas, inclusive as suas próprias, sejam bem executadas. Isso acontece porque a legislação delega orçamento, decisões administrativas e total gerência da estrutura a esse profissional. A qualidade do serviço público será garantida de maneira independente às ingerências políticas.