Obrigatoriedade da Resolução Nº 420 incentiva inserção da tecnologia na Advocacia Pública
Procuradorias que ainda não inseriram a tecnologia na Advocacia Pública têm até 28 de fevereiro de 2022 para aderir a uma solução de gestão de processos jurídicos. Esse é o prazo para dispor de um sistema com integração com os Tribunais de Justiça (TJ). Também, para garantir a distribuição de processos exclusivamente por meio digital.
A data foi estipulada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Segundo o CNJ, todos os TJs terão de aderir ao processo eletrônico a partir de 1º de março de 2022. Sendo assim, o recebimento e a distribuição de casos novos em meio físico em todos os Tribunais, à exceção do Supremo Tribunal Federal, não serão mais aceitos. Em razão disso, os Tribunais precisarão digitalizar o acervo processual físico que ainda possuem.
A Resolução Nº 420 é uma consequência de um movimento que acontece há anos no Poder Judiciário e que foi acelerado pela pandemia de coronavírus. A situação sanitária exigiu adequação do Judiciário para cumprir a determinação de isolamento social e para continuidade da prestação jurisdicional. Para isso, foi preciso recorrer a soluções tecnológicas.
Os resultados apontaram para um caminho que agora será permanente. “Medidas consideradas necessárias por conta das restrições sanitárias devem ser adotadas permanentemente, seja porque se mostraram eficazes, seja porque trouxeram economicidade e celeridade aos processos”, disse o presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, na Sessão Ordinária em que a decisão foi tomada.
Praticamente todos os agentes do Poder Judiciário já entendem o que é o processo digital. A Lei Nº 11.419 o instituiu em 2006. Falta entender, portanto, como a obrigatoriedade imposta aos Tribunais de Justiça pela Resolução Nº 420 incentiva a inserção da tecnologia na Advocacia Pública.
Resolução Nº 420 e o uso de tecnologia na Advocacia Pública
A determinação mais importante na decisão do Conselho Nacional de Justiça é esta:
Art. 1º Fica vedado o recebimento e a distribuição de casos novos em meio físico em todos os tribunais, à exceção do Supremo Tribunal Federal, a partir de 1º de março de 2022.
Há três importantes ponderações a fazer sobre este recorte do texto da resolução,. A primeira é a de que procuradorias jurídicas que não dispõem de tecnologia na Advocacia Pública ou dispõem parcialmente de soluções – ou seja, detêm ferramentas que não atendem àquilo que é o processo digital de fato -, terão de se municiar com um sistema capaz de enviar digitalmente os processos para o Tribunal.
A segunda é a de que as procuradorias jurídicas habituadas a protocolar os processos, principalmente os de Execução Fiscal, no Tribunal por meio físico – seja em função de prazo ou por falta de investimento em soluções tecnológicas -, terão de abolir esta prática em 2022. Sendo assim, precisarão investir em uma solução para gestão dos processos judiciais.
A imprevisibilidade dessa exigência, à primeira vista, faz a iniciativa do CNJ soar como uma imposição. Porém, como lembrou o ministro Fux: “O processo eletrônico desonera imensamente a advocacia, uma vez que, além de não terem que se deslocar fisicamente até as sedes físicas dos fóruns para consultas e peticionamentos, os advogados poderão ampliar as respectivas bases de atuação.”
A perspectiva de Fux pode significar para os advogados públicos uma oportunidade de executar as demandas com maior qualidade. Na Procuradoria do Município de Atibaia (SP), por exemplo, desde que a instituição implantou um sistema de automação de processos judiciais, isso já acontece, de certa forma.
“Criamos um grupo de estudos, que há tempos não conseguíamos ter, para trocar ideias a respeito de casos entre procuradores. Assim, pudemos nos debruçar em casos mais complexos para elaborar estratégias e também as normativas internas de funcionamento da Procuradoria”, revela a procuradora Patrícia Lima.
A Procuradoria de Atibaia utiliza o SAJ Procuradorias desde 2020. A implantação do sistema ocorreu pouco antes de a pandemia exigir medidas de segurança para evitar a disseminação da Covid-19. “Na comarca de Atibaia, desde 2014, todos os processos novos são digitais. Exceto alguns processos de Execução Fiscal. Então, precisávamos de um programa que fizesse o recebimento das intimações”, reforça Lima.
Trabalhar com um sistema para controle de processos judiciais fez a Procuradoria entender que dispor do acervo físico digitalizado é mais efetivo para a cobrança da dívida ativa. Atualmente, Atibaia está na fase de digitalização dos processos. Portanto, por coincidência, já está praticamente em conformidade com a Resolução Nº 420 do CNJ antes do prazo determinado.
Tudo sobre a obrigatoriedade do processo digital
A decisão do Conselho de Justiça a respeito de os Tribunais de Justiça, com exceção do Supremo Tribunal Federal, aceitarem somente processos digitais a partir de março de 2022 é motivada, entre outros, pelo fato de:
- haver disponibilidade de sistemas processuais para adoção de processo eletrônico;
- a digitalização dos processos físicos ser condição inexorável para a existência de uma prestação jurisdicional célere e eficiente;
- no médio e longo prazo, a digitalização de processos permitir uma progressiva redução de despesas no âmbito do Poder Judiciário, na medida em que viabilizará a redução do tamanho da estrutura física dos tribunais.
Dessa forma, a Resolução Nº 420 serve de:
- impulso para a inserção de tecnologia na Advocacia Pública;
- reforço sobre o que é o processo digital para o Judiciário brasileiro;
- instrutora para as regras acerca do recebimento de casos novos em meio físico.
A exceção ao processo digital é quando há alguma impossibilidade técnica ou urgência comprovada. Só mediante a uma dessas possibilidades é que o processo pode ainda ingressar de forma física no Judiciário.
No entanto, isso não significa que os casos não precisarão ser digitalizados. Pelo contrário. Esses processos deverão
ser convertidos em eletrônicos no prazo máximo de dois meses.
As mesmas regras valem para:
- inquéritos policiais;
- termos circunstanciados;
- demais procedimentos investigatórios que ainda tramitarem em meio físico;
- representações por medidas cautelares;
- eventuais pedidos incidentais que demandem decisão judicial e forem apresentados durante a fase de investigação. Junto devem ser apresentadas as peças digitalizadas da investigação.
Prazos para inserção da tecnologia na Advocacia Pública
Em relação aos prazos, a Resolução Nº 420 diz que a conversão do acervo processual físico em eletrônico deve ser concluída dentro de um período específico pelos Tribunais.
Por se tratarem de prazos para o Judiciário, a primeira impressão pode ser a de que as procuradorias, por fazerem parte da administração pública, não precisam se preocupar com essas datas. Afinal, a Resolução não se refere à instituição. O fato é que esse entendimento não é totalmente verdadeiro.
Em primeiro lugar, porque as Procuradorias dependem dos Tribunais de Justiça para ter muitas das suas questões solucionadas. Sendo assim, não há como ignorar as medidas direcionadas ao Poder Judiciário, pois elas afetam diretamente a todos os agentes que interagem com a Justiça.
A reação é em cadeia. O Tribunal não receber processos físicos depois de fevereiro de 2022 pode significar que os processos que não atendem à exceção prevista na Resolução terão o recebimento negado pelo TJ. Caso esses processos estejam próximos da prescrição da dívida, por exemplo, e sem tempo hábil para digitalização, o Estado, o Município ou a Autarquia corre os risco de perder arrecadação. Sem recursos financeiros para investir no bem-estar social, a administração pública é penalizada pelos cidadãos. Por consequência, a procuradoria poderá sofrer repressão por não ter dado a devida importância a uma normativa nacional.
Em segundo lugar, porque não se preocupar com a decisão do CNJ e seu impacto na Advocacia Pública pode representar um desinteresse da procuradoria em fazer a sua parte para aliviar o gargalo que são os processos de Execução Fiscal. Esses processos são historicamente apontados como o principal fator de morosidade do Poder Judiciário e de falta de recursos nos cofres públicos.
De acordo com o Relatório Justiça em Números 2021, do Conselho Nacional de Justiça, existem mais de 26,8 milhões de Execuções Fiscais no país. Sem esses processos, o congestionamento do Judiciário baixaria de 73% para 66,9% em 2020. Ainda, o tempo médio de tramitação do processo baixado na fase de execução cairia pela metade – passaria dos atuais 6 anos e 1 mês para 3 anos. Por fim, os processos digitais tramitam mais rápido do que os processos físicos.
Sendo assim, a procuradoria que transformar o acervo físico em digital, em atendimento à Resolução, não só estará contribuindo para os Tribunais serem mais céleres. Também estará agindo em benefício da administração pública, pois o quanto antes as dívidas forem quitadas, antes o município receberá os valores ajuizados e poderá investir em qualidade de vida para os cidadãos.
Em terceiro e último, entender que a obrigatoriedade do processo eletrônico diz respeito somente aos Tribunais e delegar essa responsabilidade apenas a eles denota que a procuradoria pode não estar preocupada com a inserção da tecnologia na Advocacia Pública. Ainda, que não há empenho da instituição em evoluir em um tema no qual se avança aceleradamente. Em especial no último ano, frente àquilo que foi exigido de adequação e inovação perante a pandemia de coronavírus.
Diante dessa possível interpretação, a decisão está entre ser a procuradoria historicamente referenciada como a que promoveu a transformação digital ou a instituição que ocasionou atraso ao Estado, Município ou Autarquia por não ter feito qualquer movimento para inserir soluções tecnológicas na administração pública e evitar problemas ao governo.
Checklist para se preparar para a transformação digital
A digitalização do acervo processual físico dos Tribunais deve ser concluída na seguinte escala:
Prazo final | % de acervo físico até 30/09/2021 |
31/12/2022 | Acima de 5% |
31/12/2023 | Entre 5% e 20% |
31/12/2024 | Entre 20% e 40% |
31/12/2025 | Acima de 40% |
Para que isso seja cumprido, os Tribunais precisam apresentar ao CNJ o Plano de Trabalho até o dia 19 de dezembro de 2021. Essa é uma exigência para a adesão ao processo eletrônico e a digitalização do acervo processual físico. Nesse Plano, devem ser especificados o:
- total de processos físicos existentes;
- percentual que o número de processos físicos representa em relação ao total de processos existentes;
- cronograma de digitalização dos processos físicos, com indicação detalhada das unidades jurisdicionais abrangidas em cada período;
- montante estimado de recursos públicos a serem destinados nos próximos dois anos para a digitalização de processos;
- custo total estimado para a digitalização total de seus processos físicos;
- detalhamento do planejamento e cronograma para a contratação do serviço de digitalização, caso a contratação de terceiros seja necessária, devendo indicar, neste caso, a data provável em que a licitação ocorrerá ou, no caso de contratação direta, quando o contrato será provavelmente celebrado; e
- demais informações que o Tribunal julgar relevantes.
As procuradorias jurídicas podem aproveitar esse checklist, que pode ser útil para criar o próprio planejamento de digitalização do acervo físico. Ele também pode contribuir para averiguar qual é o investimento necessário para inserção da tecnologia na Advocacia Pública.
O CNJ irá acompanhar o progresso dos Tribunais de Justiça cujo acervo físico for superior a 10%. Todo ano, em 30 de junho, deve ser enviado um relatório ao Conselho informando o progresso do Plano de Trabalho.
Os Tribunais também terão de comunicar para o CNJ a programação orçamentária para o ano subsequente. Nessa comunicação devem estar previstos recursos suficientes ao cumprimento do cronograma de digitalização e conversão para o digital. O prazo determinado para esse comunicado é até 31 de julho de cada exercício.
Essa mesma prática pode ser adotada pelas procuradorias interessadas em colaborar para a transformação digital completa do Judiciário. Aliás, a Resolução Nº 420 do CNJ cita as procuradorias jurídicas como possíveis parceiras dos Tribunais para conferir maior celeridade à sua programação de digitalização.
Soluções de tecnologia para a Advocacia Pública
A adesão ao processo eletrônico é imprescindível para as procuradorias poderem contribuir com a transformação digital da Justiça brasileira. Como o Conselho reforça na própria Resolução, há disponíveis no mercado sistemas processuais para facilitar essa conversão.
São soluções que atendem desde a uma única necessidade até a gestão completa da procuradoria. Por isso, o planejamento é importante. Assim, é possível avaliar as necessidades da procuradoria e a possibilidade de investimento para inserção de tecnologia na Advocacia Pública. Além de que possibilita estimar o retorno do investimento para a administração pública a curto e médio prazo.
Essa análise é fundamental, pois dispor de soluções tecnológicas que não atendam às demandas da procuradoria pode apenas gerar mais trabalho do que aquele que se tem hoje. Foi o que aconteceu com o município de Atibaia antes da implantação do SAJ Procuradorias. No município, era utilizado um sistema que apenas fazia a distribuição de ações em lote, sem recebimento de todas as intimações. “Esse sistema não nos ajudava efetivamente. Apresentava muitos erros. Geralmente desistíamos das ações distribuídas [pelo sistema] para fazer tudo novamente, de forma manual”, conta a procuradora Patrícia Lima.
Isso gerava uma preocupação constante com perda de prazo, falhas na cobrança dos tributos e até peticionamentos trocados. Uma realidade bem diferente da atual, com o SAJ para apoiar na realização da tarefas. Desde então, a instituição conseguiu aumentar a eficiência, acompanhar melhor a Execução Fiscal e ter mais confiança na execução do trabalho, pois pode realizar as distribuições em lote.
Atualmente, mais de 90 procuradorias de Estados, Municípios, Universidades e Autarquias utilizam o SAJ. Um total de 9 mil procuradores e servidores são usuários do sistema em aproximadamente 18 estados brasileiros. Por já disporem do SAJ no início da pandemia, muitas dessas procuradorias mantiveram e até aumentaram a produtividade entre março de 2020 e março de 2021. Juntas, essas procuradorias contabilizaram 1 milhão de CDAs ajuizadas e R$ 28 bilhões em ajuizamentos feitos com o SAJ.
Além disso, são procuradorias que estão prontas para atender a Resolução Nº 420 do CNJ e somente distribuir casos novos por meio eletrônico para o Tribunais de Justiça do país. As que ainda detêm acervo físico, como Atibaia, já providenciam a digitalização.
A inserção da tecnologia na Advocacia Pública, independentemente da obrigatoriedade da Resolução, tende a ser mais um marco histórico para a transformação digital da Justiça brasileira. O SAJ está pronto para contribuir com essa transformação.
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