Quem foi Algacir Teixeira de Lima e o que ele nos ensinou sobre o papel do Procurador municipal

Atualizado em: 16/04/2024

A biografia de Algacir Teixeira de Lima, por mais trágica que seja, tem muito a ensinar sobre o impacto da atuação independente de um Procurador municipal nas cidades brasileiras.

O procurador municipal de Chopinzinho, cidade agrícola com cerca de 20 mil habitantes no Paraná, foi assassinado em 2015. Ele levou seis tiros depois de ter denunciado desvios ilícitos na Prefeitura.

A trajetória de Lima está sendo lembrada pela Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM), que recentemente entregou a parlamentares um projeto de lei para homenageá-lo com a criação do Dia do Procurador Municipal (16 de março). Um documentário sobre a sua história também foi apresentado pela Associação durante o XIV Congresso Brasileiro de Procuradores Municipais.

O ex-prefeito da pacata cidade do interior paranaense, que fica a quase 400 quilômetros da capital Curitiba, Leomar Bolzani, é quem teria encomendado a execução, segundo o Ministério Público Estadual (MP-PR). As investigações ainda dizem que o gestor municipal teria combinado o pagamento de R$ 6,5 mil pela morte de Lima. A defesa, por sua vez, nega qualquer envolvimento no assassinato, que aconteceu em plena luz do dia e na frente de suas filhas, de dois e sete anos, quando o Procurador municipal retornava à casa para almoçar.

Responsabilidades investigadas

Passados três anos, o ex-prefeito, que cumpre prisão preventiva em domicílio com tornozeleira eletrônica, ainda não foi julgado pelo crime. Elvi Aparecida Haag Ferreira e Nilton Ferreira, intermediários do crime, foram condenados a 15 anos de reclusão em regime fechado. Outras quatro pessoas envolvidas no assassinato — Darci Lopes Aquino, acusado de executar o crime, João Rosa do Nascimento e Jefferson Rosa do Nascimento, acusados de serem cúmplices, bem como Giovani Baldisssera, acusado de encomendar a execução — ainda aguardam decisão judicial.

A despeito da celeridade no julgamento, a história do Procurador municipal merece ser lembrada, principalmente pelo exemplo de lisura, autonomia e compromisso com a população. Saiba o que Algacir Teixeira de Lima tem a ensinar às Procuradorias municipais e às administrações públicas:

A importância de um concurso público

Exceção em relação à maioria das Procuradorias no Brasil, Lima foi nomeado Procurador municipal por meio de concurso público específico para a carreira. E, exatamente em razão do processo seletivo, a posição que ocupava não era e nem é determinada por indicações políticas. Normalmente, quando não há concurso público, as indicações são feitas pelos próprios prefeitos. Lima não tinha qualquer relação com o ex-gestor municipal. Servia ao interesse público, por isso sentia-se à vontade para investigar qualquer suspeita.

Foi o que ele fez. Não mediu esforços para contestar irregularidades encontradas na gestão. Inclusive, encaminhou uma investigação própria ao Ministério Público. Com isso, os bens do prefeito foram bloqueados na quinta-feira que antecedeu a data do crime. De acordo com relato no documentário, o advogado Vilmar Bonfim, que chegou a trabalhar com Lima, o Procurador municipal prezava pela independência da carreira que escolhera, não importasse o que fosse, e estava sempre atento à legalidade dos atos administrativos.

A vaga de Lima foi preenchida a partir da realização de um novo concurso público. “Esse legado dele [Algacir Teixeira de Lima] tem uma influência direta na nossa atuação e nosso cenário enquanto Procuradores”, garantiu o advogado público de Chopinzinho no documentário, Mário Stringari.

O peso da constitucionalização e da proteção à carreira

Apesar de ser um município pequeno, a Procuradoria-Geral do Município de Chopinzinho foi estabelecida por meio de uma Lei Orgânica Municipal. A matéria garante a abertura de concurso público para Procurador municipal, por exemplo, e dá outras providências. Não fosse esse documento, a carreira de Lima não teria sido constitucionalizada naquele contexto.

Mesmo com essas garantias nos termos da lei, o advogado público acabou sendo fatalmente exposto à insegurança. Infelizmente, ele não é exceção. A cada dois dias, a ANPM recebe pedido de auxílio de algum Procurador municipal em dificuldades, quase sempre de Procuradores autônomos que exercem o controle da legalidade de forma eficaz, mas temem desmandos e represálias aos moldes do que aconteceu com Algacir. Essa realidade impõe a existência de mecanismos capazes de proteger a carreira da advocacia pública. Isso só é possível por meio de união e fortalecimento da categoria.

A possibilidade de combate à corrupção

Em 2017, Bolzani foi condenado por improbidade administrativa. A Justiça reconheceu que o ex-prefeito praticou atos que lesaram os cofres públicos. Então, determinou a devolução dos valores desviados e suspendeu seus direitos políticos por cinco anos. O trabalho de Algacir, nesse sentido, não foi em vão.

O Procurador municipal demonstrou que é possível combater a corrupção por meio da advocacia pública municipal. Esse é o seu principal legado, que ganha força em um local como o Brasil. Segundo o Fórum Econômico Mundial, somos o quarto país mais corrupto do mundo.

Com mais de 5 mil municípios, muitos deles pequenos, onde pode ser mais fácil cometer ilicitudes e, ao mesmo tempo, onde os problemas ainda se resolvem “na bala”, o combate às irregularidades por meio de Procuradorias estruturadas e atuantes torna-se ainda mais essencial.

Você conhece algum Procurador que já tenha se sentido ameaçado por exercer seu trabalho? Como acredita que essas situações podem ser enfrentadas com segurança? Compartilhe o seu relato conosco e não deixe de assinar a newsletter do SAJ para receber conteúdo atualizado sobre o universo das Procuradorias.